No coração de Belo Horizonte, um tesouro da arte brasileira estava prestes a desaparecer. O painel cerâmico criado pelo artista Mário Silésio, em 1959, e que adorna o antigo prédio do Detran, atual corregedoria da Polícia Civil, ficou mais de dez anos coberto por tapumes, devido ao desprendimento das cerâmicas e demais danos promovidos pela ação do tempo e do homem. Porém, graças a uma iniciativa de preservação, a obra-prima está passando por procedimentos de conservação e restauração, para que retome seu esplendor e volte a encantar as gerações atuais e futuras.
A execução do projeto para conservação e restauração do painel “Abstrato”, de Mário Silésio (1913-1990), é uma realização do Centro de Conservação e Restauração (CECOR) da Escola de Belas Artes da UFMG, em parceria com a Fundep. Ele foi contemplado via Plataforma Semente, uma iniciativa do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público de Minas Gerais (CAOMA/MPMG).
O projeto visa recuperar a fruição estética, histórica e social de uma obra que se destaca como um dos tesouros do patrimônio mineiro. Cada cerâmica do painel está sendo cuidadosamente documentada, analisada, estudada e restaurada, em processo que envolve análises e documentação científicas, além da utilização de técnicas e materiais específicos para garantir a autenticidade e integridade da obra. As cores vibrantes e os detalhes intrincados recebem atenção minuciosa, trazendo de volta a beleza original da composição de Silésio.
Mário Silésio é considerado um importante representante da arte mural no Brasil, com um estilo singular que remete à estética do abstrato geométrico, com influências dos movimentos concretista e neoconcretista. Seu painel “Abstrato” é uma peça de valor inestimável para a cultura mineira.
Além de sua imensa importância estética, o painel cerâmico de Mário Silésio representa um marco na história cultural de BH. Como uma das principais obras do artista, sua preservação enriquece e fortalece os laços da avenida João Pinheiro com o circuito Cultural da Praça da Liberdade e consequentemente com a história e a identidade Belorizontina.
Painel “Abstrato” de Mário Silésio. Foto por Claudio Nadalin.
Nascimento e Formação
Mário Silésio de Araújo Milton nasceu em 1913, em Pará de Minas, Minas Gerais, e faleceu em 1990, em Belo Horizonte. Pintor, desenhista, muralista e vitralista, iniciou seus estudos de direito na Universidade de Minas Gerais (atual Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG), em Belo Horizonte, entre 1930 e 1935.
Educação Artística
Entre 1943 e 1949, Mário estudou desenho e pintura na Escola Guignard, sob a orientação de Alberto da Veiga Guignard (1896-1962). Em 1953, recebeu uma bolsa do governo francês e viajou para Paris, onde ingressou no curso de André Lhote.
Carreira e Obras
De volta ao Brasil, entre 1957 e 1960, Mário Silésio executou diversos painéis em edifícios públicos e privados de Belo Horizonte, incluindo obras no Banco Mineiro de Produção, Condomínio Retiro das Pedras, Inspetoria de Trânsito, Teatro Marília, Escola de Direito da UFMG e Departamento Estadual de Trânsito (Detran – atual corregedoria da policia civil). Vale ressaltar que o painel executado por ele no Detran está sendo restaurado pelo CECOR, via Plataforma Semente dentro do Programa Minas Para Sempre, uma iniciativa da Coordenadoria das Promotorias do Patrimônio Cultural (CPPC) e do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente (CAOMA) do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) garantindo a preservação de seu legado artístico.
Remoção do Faceamento Antigo
Nos meses de janeiro e fevereiro de 2024, foi realizada a remoção mecânica do antigo faceamento feito com Tecido não Tecido (TNT), fixo com Carboxi Metil Celulose, sobre as cerâmicas. Durante essa etapa, a superfície foi inspecionada por meio de toques para identificar sons ocos, que indicam risco de desplacamento. As áreas afetadas receberam faceamento localizado.
Aplicação do Faceamento Localizado
O faceamento localizado foi realizado com plástico autoadesivo transparente, um material removível que não causa danos à cerâmica e permite o monitoramento visual do comportamento mecânico da peça durante os demais procedimentos, como a remoção de rejunte. Esses faceamentos serão repostos conforme a necessidade de retirada de peças em desplacamento
Avaliações e Ajustes na Estrutura de Proteção
As avaliações prévias do estado de conservação iniciaram em fevereiro de 2024, revelando a necessidade de remover parte da estrutura de proteção instalada em 2011 pelo IEPHA. Esta estrutura não apenas deixou de cumprir sua função original, como também comprometia a parte superior do painel devido à sobrecarga das vigas de madeira que sustentavam os painéis de compensado. As placas de poliestireno expandido, que serviam de interface entre as placas de compensado, estavam deterioradas e soltas, sendo removidas. Sem plataforma de acesso ao painel, foi necessário utilizar escadas e andaimes.
Recolocação dos Tapumes de Proteção
Após a remoção do faceamento antigo, os tapumes de proteção foram reposicionados para reduzir a tensão na parte superior do painel. Para facilitar o acesso ao painel, os tapumes foram seccionados no primeiro terço inferior.
Construção da Plataforma de Acesso
A construção da plataforma de acesso ao painel cerâmico “Abstrato” de Mário Silésio começou em 1º de abril e foi finalizada em 15 de abril de 2024. A plataforma foi cercada por tapumes pintados na cor cinza. No dia 16 de abril, os tapumes que cobriam a obra foram removidos, permitindo a verificação completa do estado de conservação do painel para a elaboração de novas atividades de conservação e restauração previstas.
Esse processo de restauração visa garantir a integridade e a preservação do painel, respeitando a originalidade e a beleza da obra de Mário Silésio.